quinta-feira, 5 de setembro de 2013

O Mistério do Cobertor Azul



A casa não era tão velha, era uma casa dessas normais, com sala, quartos, um banheiro simples, mas em boa condição de uso. Uma varanda que dava de frente pra uma árvore que pela aparência já estava bem velha, mas se a olhássemos bem de perto poderíamos notar que alguém havia ali deixado alguma declaração de amor. A cozinha era a melhor parte da casa, bem extensa, suas paredes eram manchadas pela fumaça do fogão à lenha e uma prateleira, deixada pelos antigos moradores, não parecia ter utilidade alguma pra minha mãe.
Meu pai não pensou duas vezes pra fazer o negócio, por ser uma casa boa e o quintal grande o bastante pra que nossos animais pudessem ficar a vontade e nós brincássemos do jeito que gostávamos. Pra ele era o que importava. Pra mim aquela casa era bem aconchegante, mas no fundo sentia como se alguma coisa estivesse fora do normal. Quando entrei no quarto, que era destinado a mim, notei que em um canto da parede havia um armário que era de uma aparência velha e que deveria ter pertencido a uma garota, pois tinha corações desenhados, frases bem românticas e juras de amor eterno, enfim coisas de menina apaixonada. Não esperei nem mais um segundo e abri aquele armário. Poeira era o que mais tinha lá dentro. O que me chamou a atenção foi um saco plástico que estava dentro do armário. Confesso que a principio fiquei com medo de abrir, mas tomei coragem e coloquei as mãos naquele embrulho que parecia estar ali há um bom tempo.
Aos poucos fui desfazendo o nó, e quando consegui abrir, encontrei um cobertor azul bem conservado, só que tomado pela poeira do tempo. Por que será que alguém deixaria um cobertor guardado ali dentro? Será que teria esquecido? Qual seria o motivo dele estar ali tão bem guardado? Perguntas sem respostas foram surgindo em minha cabeça e eu, com medo misturado com curiosidade, só queria desvendar aquele mistério. Comecei abri- lo aos poucos. Parecia que algo estava guardado em seu interior. Seria uma carta? Um bilhete? Um convite? Era só mais curiosidade surgindo em minha cabeça. Mas o que realmente encontrei ali foi uma caixinha de papel que, para minha infelicidade, estava colada. Deveria ter algo ali dentro, mas eu jamais poderia invadir a privacidade de alguém que eu nem conhecia. Preferi deixar tudo no mesmo lugar e esquecer o que tinha acontecido. Mas será que eu conseguiria?
Naquele momento meu pai nos chamou pra sala e, quando todos já estavam reunidos, ele nos perguntou se estávamos gostando da nova casa. Minha mãe, logo de cara, já disse que tudo estava do jeito que ela queria. Meus irmãos por sua vez, só falaram da diversão que para eles era o que mais importava naquele momento. Mas e eu? Bem, eu disse que estava gostando demais, afinal eu estava com um mistério para desvendar, como não poderia gostar? Meu pai satisfeito com nossa felicidade, disse que aquela casa era de uma família bem estruturada, composta de pai, mãe, filho e filha que, por um motivo de discórdia entre vizinhos, foram obrigados a mudarem dali. Nesse momento minha curiosidade foi muito mais além. Perguntei a ele se ele saberia ao certo o motivo da discórdia e ele simplesmente disse que foi coisa boba, coisa de amor. A filha deles se apaixonou pelo filho do meio do vizinho e eles não permitiram o amor dos dois. A menina entrou em uma tristeza profunda e eles acharam melhor ir embora. Eu me vi em uma situação difícil. Abriria a caixinha ou deixaria isso de lado? Sempre que entrava no quarto e olhava aquele armário a vontade aumentava ainda mais, mas aquilo não era certo.
Em uma tarde fresca sentada na varanda da casa olhei aquela velha árvore e senti como se ela me chamasse.  Quando vi já estava em frente a ela. Lá encontrei um coração com uma cobertura grossa da árvore, mas que se olhasse com jeito daria pra entender o que estava escrito. A frase era essa “Pra onde eu for serei sempre seu amor”. Fiquei pensativa com a frase e fui correndo até meu quarto e, sem pensar, abri a caixinha que estava enrolada no cobertor. Dentro havia uma carta que dizia: “Não será fácil pra mim te perder, não suportarei viver sem você. O que eles pensam sobre nós não tem nada a ver. Meu pedido não sei como chegará até você, mas sei que estou partindo e meu fim será morrer. E como lembrança do meu amor, deixo meu cobertor pra você”.
Confesso que perdi o chão, aquele pedido estava em minhas mãos e naquele momento teria que tomar a decisão mais importante da minha vida. E assim eu fiz. Procurei meu pai o mais rápido e contei toda a história a ele. A princípio ele não ficou convencido, mas em meio às provas ele começou a entender. Fomos até o vizinho, mas quando chegamos lá o pior já havia acontecido. A notícia que chegou foi que a menina havia cometido suicídio, pois o amor que ela sentia pelo rapaz a consumia dia após dia. Resolvi cumprir a missão que me fora dada, entreguei o cobertor a ele dizendo que aquela era uma lembrança deixada por ela. Ele com o olhar tristonho, deixando cair uma lágrima dos olhos, beijou o cobertor e disse bem baixinho: “descanse em paz, meu eterno amor”.


Jhorzilene Rodrigues

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